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E se Trump voltar?

A pouco mais de um ano do pleito presidencial nos EUA, há sinais inquietantes no horizonte. Já é hora de começar a considerar seriamente um cenário de volta à Casa Branca

Dawisson Belém Lopes, para Headline Ideias
#INTERNACIONAL21 de jul. de 235 min de leitura
O ex-presidente dos EUA e candidato à presidência em 2024, Donald Trump, fala na conferência Turning Point Action USA em West Palm Beach, Flórida, em 15 de julho de 2023. Foto: Giorgio Vieira/AFP
Dawisson Belém Lopes, para Headline Ideias21 de jul. de 235 min de leitura

A pouco mais de um ano do pleito presidencial nos Estados Unidos, há sinais inquietantes no horizonte. O atual presidente Joseph Biden, saudado em 2020 como vencedor da pugna política que redefiniria os rumos da humanidade, não consegue registrar altos índices de aprovação ao seu governo. Patina nas pesquisas de opinião pública e, no momento, aparenta ter mais detratores do que apoiadores.

Para piorar, seu provável adversário no ano que vem, o notório ex-presidente Donald Trump, cresce nas pesquisas. Neste mês de julho, chegou a registrar mais intenções de voto do que Biden – o que não é trivial. Basta lembrar que o provável futuro candidato do Partido Republicano jamais conseguiu ser majoritário no país, nem em seu momento apoteótico, em 2016, quando, por força do sistema estadunidense de democracia indireta, venceu a corrida eleitoral.

Decerto, ainda pode acontecer muita coisa até novembro de 2024. Objetivamente, porém, as curvas de preferência mostraram-se relativamente inelásticas nos dois últimos ciclos eleitorais – que, a propósito, envolveram Trump –, o que deveria servir de alerta sobre a resiliência do ex-mandatário. Já é hora de considerar seriamente um cenário de volta à Casa Branca dos que não se foram da política americana.

Como seria um novo mandato de Trump?

O exercício requer, a 15 meses da eleição, algum pendor para o gênero da ficção política. A revista The Economist inaugurou os esforços, ao dedicar editorial ao assunto, na semana passada. Na peça, os autores tentaram imaginar o grau de destruição às instituições democráticas que um eventual assalto trumpista ao serviço público, com demissões e reforma da máquina administrativa, ocasionaria.

O enfoque faz sentido, uma vez que Trump e seus entusiastas costumam atribuir potestades quase metafísicas ao chamado deep state. Ainda que o estrago potencial de uma ação contra as burocracias estatais seja considerável, o texto do semanário britânico entrega visão moderadamente otimista, ao reconhecer a força das defesas sistêmicas estadunidenses. 

A verdade é que Biden tem governado, desde janeiro de 2021, sob fogo cerrado. Republicanos alinharam-se de tal forma ao núcleo trumpista que, hoje em dia, é impossível imaginar uma campanha nacional em tom conciliatório. A margem para os chamados “consensos bipartidários” no Congresso estreitou-se, limitando-se ao mais essencial.

O estoque de experiências dos últimos 8 anos, com Trump na Casa Branca e, depois, como líder da oposição, condicionará a reação do Partido Democrata, na hipótese de derrota eleitoral em 2024. Não conseguiria imaginar nada muito distinto, entre parlamentares do campo Democrata, do que foi a postura pouco colaborativa dos Republicanos durante a atual gestão Biden. Haverá jogo duro.

Na política externa, a raiz do dissenso

Ambíguo em relação à aliança militar transatlântica que justificou, lá nos anos 1940, a criação da OTAN, Donald Trump não se comove com o argumento de que é preciso derrotar Putin e devolver à Ucrânia os territórios invadidos pelos russos.

Ao revés, Trump ressaltará em sua campanha presidencial os enormes custos materiais, simbólicos e humanos acarretados pela guerra, fazendo do engajamento de Biden um conveniente cavalo de batalha. Em sintonia com seu líder, eleitores Republicanos afirmaram, em recente pesquisa da Gallup, que preferem ver um desfecho rápido para o conflito na Ucrânia, ainda que a Rússia saia vencedora.

Não se trata, como se sabe bem, de vocação pacifista de Trump. Em sua passagem pela Casa Branca, entre 2017 e 2021, o empresário tensionou até onde pôde o relacionamento bilateral com a China e chegou a alimentar planos de invasão da Venezuela. O ponto parece residir na economia, mote que coesiona Republicanos de todos os quadrantes.

A dobradinha Lula-Trump vai dar liga?

Em sua terceira passagem como chefe da República Federativa do Brasil, Lula teve ocasião de conhecer de perto alguns homólogos americanos – Republicanos e Democratas – e com eles colecionar momentos.

De modo geral, Bush, Obama e Biden mantiveram relações cordiais e corretas com o presidente sul-americano, desfazendo, na prática, o mito de que os Estados Unidos sabotariam um ex-líder sindical no Palácio do Planalto. Os eventos de 2022, durante a campanha presidencial brasileira, mostraram até uma dose de boa vontade de Washington com Lula.

Poder-se-ia vaticinar, contudo, que o trato bilateral com Trump será substancialmente diferente. Afinal, ele já elogiou publicamente Jair Bolsonaro; e também já criticou abertamente Lula. Para muitos, um golpe de Estado – o que foi tentado sem sucesso em janeiro de 2023 – estaria, agora, ao alcance do que restou do bolsonarismo.

Penso que esse é um enquadramento bastante equivocado. 

Se ficar o bicho pega...

Política é, antes de tudo, a arte da contingência. Alguém realmente consegue conceber um presidente dos Estados Unidos – e, particularmente, um tipo como Donald Trump – que se mostrasse fiel ao ex-presidente duplamente derrotado – na urna e na Justiça – do Brasil, movendo por ele céus e terras? Tal cenário é de todo irrazoável.

De mais a mais, Trump sempre mostrou certo encantamento por líderes populares, não se limitando aos colegas da direita. O exemplar mais intrigante, por se tratar de um líder da esquerda democrática, é Andrés Manuel López Obrador, atual presidente do México. A despeito de toda a grita inicial, AMLO e Trump tornaram-se bons camaradas e, no limite, compuseram um dueto funcional. Por que haveria de ser diferente com Luiz Inácio?

Não há, então, motivos para temer o futuro? É óbvio que os há. Porém, como dizem, o medo é mau conselheiro. Sigamos adiante. Com ou sem Trump na Casa Branca.

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